quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Tristana

Alguma vez ao andar despreocupado pela rua ou tomar o ônibus  você já se deparou com alguma figura curiosa , alguma pessoa que você jamais havia visto antes e que o deixou curioso e intrigado ? A enciclopédia UNIVERSAL , publicada no distante ano de 1969 , entre as várias definições para a palavra PSICOLOGIA traz a seguinte : " CIÊNCIA QUE ESTUDA AS IDEIAS , AS DETERMINAÇÕES E SENTIMENTOS , QUE FORMAM EM CONJUNTO O ESPÍRITO HUMANO . " É certo que a essa ciência evoluiu muito de 1969 para cá e foi-se o tempo em que o psicólogo se limitava a ouvir o paciente deitado no divã , tentando compreendê-lo  ; mas tentar desvendar o complexo comportamento de uma pessoa continuará a ser uma tarefa dificílima e se é difícil para um profissional imagine para um leigo......Caminhando pelo centro de Joinville , o que certamente deve ser uma das fontes de inspiração para sua bem humoradas histórias , HILTON GORRESEN , acabou conhecendo uma figura triste e um tanto enigmática ..........Na crônica de hoje ele nos revela o seu lado psicólogo e tenta desvendar essa estranha pessoa . CONFIRA :

"Em minhas caminhadas pelo centro da cidade , encontro sempre uma jovem diante de um prédio residencial . Creio que presta serviços ali . É uma jovem de belo talhe ( esta é uma palavra quase em desuso , da qual os autores românticos abusavam , lembram de Iracema que tinha o talhe de palmeira ? ) , rosto cor de oliva , com olhos tristes e melancólicos  , um leve vinco de preocupação ( ou será de enxaqueca ? ) na testa . Tem um jeito calado .



 Nunca lhe vi o sorriso , mas imagino que seja um sorriso melancólico . A boca é pequena e cheia , lambra o ' biquinho ' da Rosinha  ( GRAVURA ABAIXO ) , namorada do Zé Carioca ,



 e tem os cabelos puxados para trás .

 Dei-lhe o nome de Tristana , título de um filme de Bruñel  , ( FOTO ABAIXO )



 com a então bela da tarde Catherine Deneuve  . ( FOTO ABAIXO )



 A personagem do filme não era triste , é apenas um nome . Mas acredito que nomes devem combinar com as pessoas , os nomes se agarram ás pessoas como pedaços de fita adesiva nos dedos . Tristana tem de ser uma pessoa triste , assim como Felício tem de ser um camarada alegre  e Clarice uma jovem cheia de brilho de sol .

 Com essa mania de querer desvendar o íntimo de desconhecidos , imagino que se trata de uma mãe solteira , com um filho de nove ou dez anos . Por que toda essa tristeza ? Talvez porque não tem mais notícias do pai da criança e teve que dar duro para sustentar o filho . Ou talvez porque seja uma pessoa solitária .



 Não é que eu passe por ali esperando encontrá-la ; quando vejo , ali está ela diante do prédio , e não posso deixar de notá-la . Usa calças compridas , sandálias sem salto , unhas bem feitas , mas as mãos um tanto grosseiras  . Às vezes fico pensando se ela notou que passo diariamente por ali , fingindo estar distraído ; se tentou imaginar quem eu possa ser . Talvez nunca haja reparado quando eu passo , ou talvez me tenha achado também uma pessoa triste . ( ABAIXO , HILTON GORRESEN )



 Creio que será difícil arrancar um sorriso seu .



 Provavelmente nunca vai falar comigo - por que haveria de fazê-lo ? -  e nunca vou me dirigir à ela .

 Quando escrevo esta crônica , faz uma semana que não a encontro diante do prédio e isso me chamou a atenção . Será que foi despedida ? Ou tirou férias e foi para a casa de seus pais  , no interior ( outra suposição minha ) ?



 Quem sabe regresse mais alegre , sem o peso de uma desilusão a lhe marcar as feições . Quem sabe um dia resolva me cumprimentar . Não quero saber seu nome , provavelmente não irá combinar com ela tão bem como Tristana . "


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